"Terríveis são as viagens no tempo e O cinema de meus olhos é uma delas. Terríveis hoje em dia, pois remetem a um passado que era quase um futuro, um passado que se mostra muito mais refinado que estes duros choques do presente. O cinema era uma seqüela do sonho e virou um trem fantasma envenenado, uma sucursal da guerra. Nesta viagem no tempo que são as crônicas de Vinicius, vemos que o cinema já teve uma alma, e que mesmo os mais comerciais produtos de Hollywood tinham inocência. Como era delicado o mundo sem a televisão... As imagens se moviam com um desejo de permanência, que hoje a poluição visual da "iconosfera" massacrou. Que poderemos ver, se tudo é uma horda infernal de imagens uivando por um lugar ao sol da mídia? Só o silêncio poderá salvar-nos desta gritaria.

Quando Vinicius ia ao cinema, a imagem era uma esperança, não um ferro-velho se amontoando em nossos olhos. Cada fotograma aspirava a um sentido, cada filme buscava uma remissão. A "Arte" ainda era uma força revolucionária. Um mundo belo e ingênuo fluía nas telas dos odeons, dos palácios, dos politeamas, dos roxies, dos rians, enquanto Vinicius andava de bicicleta com Rubem Braga no Leblon. O cinema tinha aura, hoje não tem mais. Antes éramos fans, hoje somos targets. Antes íamos sonhar no escuro, hoje vamos nos aturdir mais que na rua. Hoje toda fotografia é genial e todo filme uma droga. Mas não pensem que as crônicas e críticas aqui contidas sejam repassadas de ingenuidade e inocência, ou toscas visões de um crítico amador. Vinicius demonstra uma noção do que é (ou do que poderia ter sido o cinema) que arroja na ignorância os videoclipeiros, os intoxicados tecnicistas de hoje, que pensam que tudo começou agora. A ignorância é hoje, inocência é hoje, numa arte que parece andar para trás quanto mais os meios técnicos se aprofundam. Hollywood ainda sonhava um sonho democrático, Hollywood ainda não era o exterminador do futuro do cinema. Ler as crônicas de Vinicius não é um passeio por um passado que acabou, é viajar a um futuro que não veio."

Ed. Cia. das Letras

O CINEMA DE MEUS OLHOS - Vinicius de Moraes

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"Terríveis são as viagens no tempo e O cinema de meus olhos é uma delas. Terríveis hoje em dia, pois remetem a um passado que era quase um futuro, um passado que se mostra muito mais refinado que estes duros choques do presente. O cinema era uma seqüela do sonho e virou um trem fantasma envenenado, uma sucursal da guerra. Nesta viagem no tempo que são as crônicas de Vinicius, vemos que o cinema já teve uma alma, e que mesmo os mais comerciais produtos de Hollywood tinham inocência. Como era delicado o mundo sem a televisão... As imagens se moviam com um desejo de permanência, que hoje a poluição visual da "iconosfera" massacrou. Que poderemos ver, se tudo é uma horda infernal de imagens uivando por um lugar ao sol da mídia? Só o silêncio poderá salvar-nos desta gritaria.

Quando Vinicius ia ao cinema, a imagem era uma esperança, não um ferro-velho se amontoando em nossos olhos. Cada fotograma aspirava a um sentido, cada filme buscava uma remissão. A "Arte" ainda era uma força revolucionária. Um mundo belo e ingênuo fluía nas telas dos odeons, dos palácios, dos politeamas, dos roxies, dos rians, enquanto Vinicius andava de bicicleta com Rubem Braga no Leblon. O cinema tinha aura, hoje não tem mais. Antes éramos fans, hoje somos targets. Antes íamos sonhar no escuro, hoje vamos nos aturdir mais que na rua. Hoje toda fotografia é genial e todo filme uma droga. Mas não pensem que as crônicas e críticas aqui contidas sejam repassadas de ingenuidade e inocência, ou toscas visões de um crítico amador. Vinicius demonstra uma noção do que é (ou do que poderia ter sido o cinema) que arroja na ignorância os videoclipeiros, os intoxicados tecnicistas de hoje, que pensam que tudo começou agora. A ignorância é hoje, inocência é hoje, numa arte que parece andar para trás quanto mais os meios técnicos se aprofundam. Hollywood ainda sonhava um sonho democrático, Hollywood ainda não era o exterminador do futuro do cinema. Ler as crônicas de Vinicius não é um passeio por um passado que acabou, é viajar a um futuro que não veio."

Ed. Cia. das Letras